O que pode ou não ser definido como música? Quais são os critérios valorativos capazes de sentenciar que determinadas canções são “boas” e outras “ruins” para serem ouvidas? Em que medida, do ponto de vista comunicacional e culturológico, tal patrulhamento guarda implicações políticas? Na tentativa de refletir sobre essas questões, os pesquisadores Mário Rolim e Jeder Janotti Jr. buscaram no pensamento do filósofo francês Jacques Rancière caminhos possíveis para tensionar os dissensos políticos e culturais presentes em performances musicais. A pesquisa resultou no trabalho apresentado no GP Comunicação, Música e Entretenimento do 42º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação (Intercom).
Partindo da hipótese de que aspectos políticos de performance ou escuta musical são eclipsados dos debates no campo da Comunicação, com pouca ou nenhuma margem para analisar contradições articuladas com teorias políticas, Rolim e Janotti Jr. encontram nas polícias de gênero um elemento importante para discutir a relação epistemológica entre música e política. Para eles, trata-se de pensá-la acima de tudo na ordem de uma incorporação do sensível de outros espaços e temporalidades.
Em análise da Batalha da Escadaria, uma disputa de rap realizada quinzenalmente (ou semanalmente, a depender do mês) no centro do Recife, os autores investigam como o discurso de “resistência”, defendido pelos rappers/MCs, se alinha às reconfigurações da experiência sensível que emerge da ocupação de espaços urbanos por determinadas sonoridades. Mais além da política institucional ou dos problemas sociais manifestados na expressão musical dos artistas, como apontam Rolim e Janotti Jr., a existência de um evento como a Batalha coloca em jogo questões de classe, gênero, raça e nação por quem muitas vezes não é contado como parte da música.
Os pesquisadores buscam, portanto, identificar o quanto dos consensos em torno da música que está chancelada a ocupar os espaços urbanos se adequam a certos gêneros musicais, em função de polícia do que “tem qualidade” ou não. Considerando que os paradoxos políticos que surgem da produção e escuta desses sons e ruídos são constantemente apropriados e reapropriados como novos consensos, torna-se praticamente impossível ignorar a importância desses fenômenos na composição da paisagem sonora urbana contemporânea.
Para acessar o artigo:
http://portalintercom.org.br/anais/nacional2019/resumos/R14-0500-1.pdf
O pesquisador Mário Rolim concedeu entrevista ao Diario de Pernambuco sobre a Batalha da Escadaria:
por Mariana Lins